No inverno, o
sol bate aqui na varanda. Um sol fraquinho, aconchegante, renovador. Ele aquece
a pele da gente e abre os sentidos para o correr da tarde.
Da rua, vem o
som dos porteiros noticiando o balanço do dia, enquanto sacodem as vassouras para
espantar folhas e outras coisinhas da calçada. Lá longe, e também perto,
cachorros vizinhos reclamam suas vontades. Do terreno em frente – aquele que já
teve uma casa grande, que depois virou escola –, saem estalos de um amontoado
de concreto e tábuas, que explica o porquê dos ruídos que nos acordam bem
cedinho.
Por causa do sol,
a sinfonia que vem da praça também fica mais forte. As crianças correndo,
gritando, provando que o brincar ainda tem, sim, lugar entre telas e frases
curtas. Entre os postes, uma família de miquinhos desfila apressada na fiação,
fugindo das bicadas do bem-te-vi, que defende o seu ninho. Um casal de maritacas
dialoga alto, dança e desaparece no azul. No lugar, vem um avião, e o seu barulho
traz a infância, quando uma aparição como esta era um acontecimento extraordinário,
na monotonia de uma cidade do interior.
Passam carros,
correm motos, bicicletas. Passa a tarde, passa o tempo, e o sol começa a avisar
que já vai. Tudo simples, corriqueiro, repetitivo, e também tão singular. As
pessoas, as vozes, os pássaros, o cheiro de flor, as gatinhas dormindo, o
avião. Um recorte da vida de verdade. Aquela que está sempre aqui, atestando a
sua concretude. Um poema que já vem pronto.
Que bom que, no inverno, o sol bate aqui na varanda!
Cíntia Nascimento