segunda-feira, 24 de abril de 2023

Terreiro



Bonecas de milho cozinhavam mato nas panelinhas de barro, sobre o fogão de tijolo e gravetos.

As casinhas de taquara tinham poço de lata de cera.

As vaquinhas de chuchu pastavam, faceiras, ao lado de besouros e minhocas.

As galinhas ciscavam receios naquelas manhãs geladas de julho.

Do tanque, vinham o acalanto da torneira e o batuque da roupa na pedra.

Gatinhos brotavam de noite e eternizavam nossas manhãs.

Eu colhia a hortelã crescida ao lado da cerca e livrara as cebolinhas do picão.

Só tinha medo do pé de figo. Mais do que dos espinhos do limoeiro.

A escada de cimento protegia meus segredos de menina.

No porão, a balança antiga, o chão de limo verde, as penas pairando e os passos de botina.

Tantos tropeços nas colunas caídas, restos do que um dia também tinha sido casa.

 Banana frita com farinha, nos lanches das tardes recortadas por tios e primos.

Histórias germinavam junto ao formigueiro.

– Não passa do portão, menina!

Nunca. O mundo já estava todo ali.  


Cíntia Nascimento


Foto: Freepik