sexta-feira, 22 de abril de 2022

Atração principal

 


         Parece que a lembrança de algumas histórias sobrevive ao tempo com o único objetivo de não nos afastar de quem realmente somos e fomos. Entre tantas, gosto de evocar uma que comprova que um dia fui uma destemida inocente. O roteiro conta com a cumplicidade de três amigas muito queridas, companheiras de um percurso pavimentado de peripécias. Foi quando, lá pelo início dos anos 1990, em Minas, cismamos que entraríamos de graça no show do cantor Fagner e, para isso, elaboramos um plano no mínimo imperfeito.

Munidas de câmera fotográfica sem filme, de gravador sem pilha e de muita cara de pau, desembarcamos na entrada do ginásio onde aconteceria o almejado espetáculo. Sem qualquer sinal de timidez, informamos que éramos estudantes e que queríamos entrevistar o cantor para um trabalho da faculdade. Óbvio que o segurança, do alto de sua notável carioquice, desconfiou daquelas quatro mineirinhas, todas muito bem arrumadinhas, que chegaram sem aviso algum. Não sei se foi por maldade ou por piedade mesmo, mas o fato é que o homem pediu que a gente esperasse enquanto ele iria falar com o astro da noite. Até parece! Ficamos ali paradas, enquanto uma fila de conhecidos nos olhava sem entender nada. Mas de uma coisa tínhamos certeza absoluta: o Fagner iria nos receber de braços abertos. Sem qualquer dúvida.

            Depois de muito tempo, muita conversa e muita enrolação, o segurança nos avisou que, infelizmente, o cantor não poderia nos receber naquela ocasião:

            – Mas, qualquer coisa, no mês que vem estaremos no Canecão! – disse o homem para as desoladas fãs, que concordaram e agradeceram com a maior educação.

            “Nem Canecão, nem canequinha!” Assim uma das amigas muito bem resumiu nossa tentativa frustrada. O plano foi um fiasco, porém aquela noite terminou em muitas risadas embaladas pelo orgulho de termos tentado.

A verdade é que cada uma de nós seguiu seu caminho. E, ainda hoje, nas felizes ocasiões em que podemos estar juntas, nos lembramos com saudades daquelas quatro corajosas garotas, que acreditavam poder conquistar o mundo, com ou sem ingresso. Não vimos o show, muito menos entrevistamos o Fagner. Mas aquele sentimento de que tudo poderia dar certo nas nossas vidas ainda é a atração principal de todas as nossas histórias.

Cíntia Nascimento