sexta-feira, 17 de abril de 2015

O resgate


             – Moça, a senhora pode me ajudar? – foi o que saiu do interfone, naquela tarde de terça-feira. Era uma voz de menino, de uns 11, 12 anos. 


            – O que você deseja? 

         ­– É que a gente viu um passarinho que não estava conseguindo voar, tentamos pegar, mas ele pulou aí pra dentro do seu prédio. A senhora pode abrir o portão pra gente entrar e pegar ele?

         A surpresa daquele pedido me tomou por alguns segundos e, antes que eu pudesse ter qualquer tipo de reação, a voz me informou feliz e prontamente:

         – Não precisa mais, não! Ele já saiu.

         Larguei tudo e corri pra varanda para dar imagem àquela cena que já se desenhava na minha cabeça. Do alto, vi dois garotos, uniforme de escola, mochilas nas costas. Com um pequeno pássaro nas mãos, cochichavam resoluções importantíssimas, decidindo o futuro daquele ser de asa quebrada. Não demorou quase nada e retomaram o passo, confiantes, com parte da missão cumprida.

         A verdade é que senti uma pontinha de tristeza por não ter tido a sorte de participar ativamente de um resgate tão valioso. Entretanto, fui presenteada com outra espécie de sentimento: a esperança. É que em dias de tanta violência, desrespeito e falcatruas, um esforço tão doce e despretensioso como aquele me chamou de volta à vida. Ver os meninos interrompendo a volta pra casa pra salvar o passarinho me fez acreditar que nem tudo está perdido. Que ainda dá pra pensar num futuro menos desesperador. 

         Nunca saberei se o passarinho voltou a ganhar o céu, mas tenho muito a agradecer àqueles dois heróis. Quando saíram altivos, certos de que salvaram o dia, nem tinham a dimensão da importância que aquele resgate tinha tomado. Ainda não consigo voar de verdade, mas perdi um pouco do medo de sair da gaiola.


Cíntia Nascimento