–
Moça, a senhora pode me ajudar? – foi o que saiu do interfone, naquela tarde de
terça-feira. Era uma voz de menino, de uns 11, 12 anos.
–
O que você deseja?
–
É que a gente viu um passarinho que não estava conseguindo voar, tentamos
pegar, mas ele pulou aí pra dentro do seu prédio. A senhora pode abrir o portão
pra gente entrar e pegar ele?
A
surpresa daquele pedido me tomou por alguns segundos e, antes que eu pudesse
ter qualquer tipo de reação, a voz me informou feliz e prontamente:
–
Não precisa mais, não! Ele já saiu.
Larguei
tudo e corri pra varanda para dar imagem àquela cena que já se desenhava na
minha cabeça. Do alto, vi dois garotos, uniforme de escola, mochilas nas
costas. Com um pequeno pássaro nas mãos, cochichavam resoluções importantíssimas, decidindo
o futuro daquele ser de asa quebrada. Não demorou quase nada e retomaram o passo,
confiantes, com parte da missão cumprida.
A
verdade é que senti uma pontinha de tristeza por não ter tido a sorte de
participar ativamente de um resgate tão valioso. Entretanto, fui presenteada com
outra espécie de sentimento: a esperança. É que em dias de tanta violência, desrespeito
e falcatruas, um esforço tão doce e despretensioso como aquele me chamou de volta à
vida. Ver os meninos interrompendo a volta pra casa pra salvar o passarinho me
fez acreditar que nem tudo está perdido. Que ainda dá pra pensar num futuro
menos desesperador.
Nunca
saberei se o passarinho voltou a ganhar o céu, mas tenho muito a agradecer
àqueles dois heróis. Quando saíram altivos, certos de que salvaram o dia, nem
tinham a dimensão da importância que aquele resgate tinha tomado. Ainda não
consigo voar de verdade, mas perdi um pouco do medo de sair da gaiola.
Cíntia Nascimento