Se eu gosto de envelhecer? É certo
que não. Mas gosto menos ainda de perder noites escavando mágicas para segurar
minhas bochechas ou contando as manchinhas que pululam nos meus braços. Saudade
que tenho é de minha avó Maria. Envelheceu e pronto. Nada de prantos,
martírios, desesperos. Seu tempo passou e mais nada.
Ginástica para ela era fritar
bolinhos nas escaldantes tardes mineiras. Já pilates, isso ela fazia,
estendendo roupas no terreiro, depois de muita aeróbica no tanque. Agora, ioga,
ela praticava com gosto. Debruçada no murinho de frente pra rua, meditava horas
sobre tudo e sobre nada, enquanto a vida tartarugueava à sua frente. Satisfeita, pontuava o dia filosofando com a
vizinha. E lá se iam – ou ficavam – todas as calorias de que ela não precisava.
Andar na moda? Coisa à toa. Seu
guarda-roupa reunia uma infinidade de quatro ou cinco vestidos de modelo único.
Só se revezavam nas estampas. Mas desfilava sempre elegante, é verdade. Pra não
dizer que estava de mal com a formosura, vó Maria tinha um único luxo, que
cabia num frasquinho de loção capilar. “É bom pra tirar o amarelado dos fios”, receitava.
De tão sem vaidades, partiu quieta. Não quis dar trabalho a ninguém, imagine.
Assim, quando começo a não me
reconhecer no espelho, uso meu antídoto preferido: invoco vó Maria. Óbvio que
não tenho nem terei a dignidade de carregar rugas como as dela (quem dera!),
nascidas e criadas na vida de moça da roça. Longe disso. Mas pretendo, sim, apresentar
com orgulho as minhas, amenizadas por muito ácido retinoico, não nego.
Talvez vó
Maria tenha ostentado tanta altivez para me fazer entender, hoje, o quanto a
velhice é só mais um slide dessa
breve estadia. Talvez ela tenha sido tão firme, tão bonita, para que um dia eu
também quisesse ser a vó Maria de alguém. E conseguiu.
Cíntia Nascimento